Um funcionário público que mude de categoria, sem concurso, pode ganhar mais, mas regride para o ordenado inicial, quando se torna efetivo no novo cargo. Executivo quer corrigir a situação no OE2025.
O Governo quer garantir que o aumento salarial de um funcionário público que passa para outra categoria em situação de mobilidade, sem concurso público, se torna permanente ao fim de três anos, quando há a consolidação na nova posição. O objetivo é evitar que o trabalhador regrida para o ordenado de origem, que é inferior, segundo os esclarecimentos prestados ao ECO pela especialista em Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, Ana Rodrigues de Almeida, sócia contratada da Abreu Advogados, com base na proposta que o Executivo entregou esta terça-feira aos sindicatos. O projeto de diploma visa clarificar o pedido de autorização legislativa que foi inscrito no Orçamento do Estado para 2025 (OE2025). Entretanto, a informação foi confirmada ao ECO pelo Ministério das Finanças.
“O trabalhador em mobilidade na categoria, em órgão ou serviço diferente ou cuja situação jurídico-funcional de origem seja a de colocado em situação de requalificação, pode ser remunerado pela posição remuneratória imediatamente seguinte àquela em que se encontre posicionado na categoria ou, em caso de inexistência desta, pelo nível remuneratório que suceda ao correspondente à sua posição na tabela remuneratória única”, de acordo com a lei atual e que a proposta do Executivo mantém. “E nunca pode ficar a ganhar menos”, acrescenta Ana Rodrigues de Almeida.
Contudo, no momento da consolidação na nova categoria, isto, é quando o trabalhador fica efetivo na nova posição, volta ao “posicionamento remuneratório detido na situação jurídico-funcional de origem”, de acordo com o está estabelecido no número 5 do artigo 99.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Pública.
A nova redação dada a este ponto pela proposta do Governo garante que “o posicionamento remuneratório detido durante a mobilidade […] só se consolida após um período de exercício efetivo de funções com a duração de 36 meses”. Assim, o trabalhador mantém o novo ordenado, mais alto, se ficar no cargo durante pelo menos três anos, clarifica a jurista.
“O posicionamento remuneratório detido durante a mobilidade […] só se consolida após um período de exercício efetivo de funções com a duração de 36 meses.”
Proposta do Governo
A legislação atual define que a consolidação acontece quando “a mobilidade tenha tido, pelo menos, a duração de seis meses ou a duração do período experimental exigido para a categoria, caso este seja superior”, que pode ir até 240 dias ou oito meses. “O trabalhador que foi em mobilidade para uma posição nova passou a ganhar mais, mas só temporariamente, porque, quando o funcionário se consolida na nova categoria, volta ao salário de origem, ficando com um vencimento inferior face aos seus pares que exercem as mesmas funções”, detalha Ana Rodrigues de Almeida. De salientar, contudo, que este trabalhador pode não ficar efetivo ao fim de seis meses ou oito meses, mantendo-se em mobilidade durante anos. E, enquanto esta situação se mantiver, continua a ganhar pela posição remuneratória mais elevada, ou seja, não regride para o ordenado anterior.
Com a mudança à lei, “o Governo vem corrigir um tratamento desigual, porque deixa de haver trabalhadores com responsabilidades e cargos iguais e com vencimentos diferentes”, colocando como requisito a manutenção em mobilidade durante 36 meses ou três anos, salienta a especialista.
Além disso, passa a “regular algo que já acontecia na prática, que é o prolongamento dos trabalhadores em mobilidade por vários anos, quando a lei determina que, no máximo devem estar dois anos nessa situação”. Com a agravante de que estes trabalhadores podem deixar de beneficiar do aumento salarial que lhes foi atribuído, se consolidarem na nova categoria. A alteração proposta pelo Executivo de Luís Montenegro garante assim a manutenção da nova posição remuneratória, desde que o funcionário permaneça na categoria três anos.
A advogada alerta que “este regime deveria ser usado de forma muito limitada e excecional para colmatar necessidades urgentes de trabalhadores”. Mas, nos últimos anos, “os vários Governos têm recorrido com demasiada frequência a este instrumento”, assinala Ana Rodrigues de Almeida.
Uso abusivo do regime arrisca ser inconstitucional
A própria lei estabelece que “a mobilidade tem a duração máxima de 18 meses”, podendo ser prorrogada pelo “período máximo de seis meses quando esteja a decorrer procedimento concursal que vise o recrutamento de trabalhador para o posto de trabalho preenchido com a mobilidade”. “A colocação de trabalhadores pelo regime de mobilidade, sem abertura de procedimento concursal deveria servir apenas para satisfazer faltas emergentes de recursos humanos, enquanto decorre o concurso público, mas o que tem acontecido é que esses trabalhadores permanecem em mobilidade anos, porque os vários Orçamentos do Estado têm colocado uma norma que prorroga a vigência das mobilidades“, assinada.
O artigo 20.º da proposta orçamental para o próximo ano estabelece que “as situações de mobilidade existentes à data da entrada em vigor da presente lei cujo limite de duração máxima ocorra durante o ano de 2025 podem, por acordo entre as partes, ser excecionalmente prorrogadas até 31 de dezembro de 2025”.
“Todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso.”
Constituição da República Portuguesa
Esta situação até “levanta dúvidas constitucionais, uma vez que o recrutamento de funcionários para a Administração Pública deve ser feito por concurso público e não por escolha de um dirigente”, sinaliza a jurista. A Constituição da República Portuguesa determina, no artigo 47.º, que “todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso“.
“O facto de o Governo abrir agora a porta a que um funcionário público possa beneficiar de um aumento salarial que se torna permanente ao fim de três anos por via da mobilidade e sem concurso público agrava o risco de inconstitucionalidade da forma como está a ser usado o regime”, avisa Rodrigues de Almeida.
A jurista considera ainda que “esta é uma forma de colmatar falhas quando os concursos ficam desertos, designadamente no caso dos informáticos ou dos juristas, mas também de não abrir concursos públicos”.
Funcionários em mobilidade já são 11% do total
Os dados da Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP) mostram que pelo menos desde 2019 a entrada de trabalhadores através do regime de “mobilidade e outras situações” tem estado sempre a aumentar. Há cinco anos, 52.818 entraram por aquela via, num universo de quase 700 mil funcionários, o que corresponde a 7% do total. No ano passado, o número já ia nos 68.241, o que representa 9% do emprego público, que se fixou em pouco mais de 756 mil trabalhadores. As estatísticas mais recentes indicam que, até setembro deste ano, 83.359 funcionários deram entrada na Administração Pública por via da mobilidade, o que significa 11% do universo de 746,5 mil empregados do Estado.
De salientar que a DGAEP junta os números dos trabalhadores que entram em mobilidade, sem concurso públicos, e “outras situações” que inclui também “recrutamento interno, cedência, regresso de licença sem remuneração ou de período experimental, comissão de serviço (início ou regresso)”, de acordo com o mesmo instituto.
Por: Salomé Pinto – eco.sapo.pt
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